27/09/2025 18:00

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Infecções por arboviroses aumentam risco de complicações no parto, aponta Fiocruz

As chamadas arboviroses, doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti, como dengue, zika e chikungunya, representam uma preocupação crescente para a saúde materno-infantil no Brasil.

Selecionado como um dos 50 melhores artigos publicados recentemente sobre saúde pública na revista Nature Communicationsum estudo da Fiocruz analisou mais de 6,9 milhões de nascidos vivos no país, entre 2015 e 2020, e revelou que a infecção por esses vírus durante a gravidez está associada a maiores riscos de complicações no parto e para os recém-nascidos, incluindo parto prematuro, baixo peso ao nascer e até morte neonatal.

Os achados da pesquisa, conduzida por cientistas do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), indicaram que infecção por arboviroses durante a gestação elevou o risco de parto prematuro, baixo escore de Apgar (avaliação rápida realizada após o nascimento para verificar a adaptação à vida fora do útero) e óbito neonatal. 

Com relação às doenças, a dengue, além de estar ligada ao parto antes do tempo e ao baixo peso, também mostrou associação com alterações estruturais e funcionais no desenvolvimento do feto, chamadas de anomalias congênitas. No caso da zika, os efeitos adversos foram ainda mais amplos, com destaque para as más-formações congênitas, cujo risco foi mais que duplicado entre bebês de mães infectadas. 

Líder da pesquisa, Thiago Cerqueira-Silva destaca, no entanto, que os padrões de risco variam entre o vírus e o período da infecção. “O estudo fornece evidências robustas e detalhadas que desmistificam a ideia de que apenas a zika é uma grande ameaça na gravidez. Demonstramos que a chikungunya e a dengue também têm consequências graves, como o aumento do risco de morte neonatal e anomalias congênitas. Essa informação é crucial para direcionar a atenção clínica e de saúde pública”, explica.

O pesquisador ainda pontua que o estudo traz novas evidências sobre os impactos das infecções por arbovírus na gestação, indicando períodos de maior vulnerabilidade em cada trimestre. A variação do risco sugere que diferentes mecanismos biológicos atuam em cada fase, o que reforça a importância da vigilância e da prevenção ao longo de toda a gravidez.

Complicações no parto

“Nosso estudo define as ‘janelas críticas’ de vulnerabilidade, mostrando em qual trimestre cada infecção apresenta maior risco. Isso permite que profissionais de saúde orientem melhor as gestantes e intensifiquem a vigilância nos períodos de maior perigo. Finalmente, considerando as mudanças climáticas, o estudo é relevante para regiões além das tropicais”, Thiago observa.  

O que motivou o grupo a se debruçar no tema foi a limitação de estudos que investigam as consequências clínicas da infecção por arbovírus durante a gravidez, além da existência de conclusões conflitantes na literatura científica.  

“Os estudos anteriores eram, em sua maioria, baseados em coortes pequenas, o que limitava a capacidade de avaliar múltiplos desfechos com precisão. Além disso, muitos continham falhas metodológicas importantes, como o ‘viés de tempo imortal’, que ocorre ao não tratar a infecção como um evento que acontece em um ponto específico durante a gestação, podendo subestimar os verdadeiros riscos. Nosso objetivo era superar essas limitações”, o pesquisador destaca.  

“Ao analisar a infecção como um evento que varia no tempo, obtivemos estimativas de risco mais precisas. Se tivéssemos usado a abordagem tradicional (desconsiderando qual momento a infecção ocorre), os riscos de parto prematuro e baixo peso ao nascer teriam sido subestimados ou até mesmo mascarados. Isso mostra que a forma como analisamos os dados é tão importante quanto os dados em si”, completa.

A pesquisa utilizou dados da Coorte de 100 Milhões de Brasileiros do Cidacs/Fiocruz Bahia e, para reforçar a consistência dos resultados, os pesquisadores aplicaram um “controle negativo”: analisaram infecções por arbovírus ocorridas entre 6 e 24 meses antes da gravidez. Nessa análise, os efeitos por infecções anteriores as gestações foram mínimos ou não existentes, reforçando que os achados do estudo são robustos.

Prevenção das infecções durante a gravidez

Para o pesquisador, os resultados do estudo deixam claro que é preciso fortalecer as medidas de prevenção durante a gestação. Isso não apenas protege a saúde das mães, mas também ajuda a evitar consequências que podem marcar a vida dessas crianças por muitos anos.  

Em comunidades vulnerabilizadas, a maior exposição ao mosquito transmissor aumenta o risco de infecção, e os efeitos durante a gravidez tendem a ser mais severos. Além disso, o peso financeiro no cuidado de crianças com anomalias congênitas ou complicações neonatais recai de forma desigual sobre famílias com baixa renda.

“É esperado que essas infecções causem maior impacto em populações mais vulneráveis. As populações mais vulneráveis estão mais expostas ao vetor, têm maior chance de serem infectadas e, consequentemente, sofrem mais com os desfechos adversos na gestação”, enfatiza Thiago.

Diante desse cenário, o pesquisador defende que políticas públicas sejam direcionadas principalmente para a prevenção primária, como estratégia central para reduzir disparidades. A urgência de ampliar a cobertura vacinal contra dengue, e adicionar a vacinação contra chikungunya na política nacional de imunização, é uma das recomendações.

“Garantir que as vacinas existentes (dengue e chikungunya) e as futuras sejam oferecidas gratuitamente e com ampla cobertura, priorizando áreas de maior risco, é fundamental para proteger todas as gestantes, independentemente de sua condição socioeconômica. Além disso, campanhas educacionais informando sobre os riscos associados à dengue e à chikungunya durante a gestação são necessárias, uma vez que atualmente apenas os impactos negativos da zika são bem difundidos”, indica. 

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