20/11/2025 18:46

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Gestantes em áreas vulneráveis têm até 68% mais risco de perder o bebê

Um estudo conduzido por pesquisadores da Fiocruz, da London School of Hygiene and Tropical Medicine, da Universidade de São Paulo (USP) e da Western University (Canadá) revelou que quanto maior a privação socioeconômica de um município, maior é o risco de natimortalidade, que é o falecimento do bebê antes do nascimento a partir da 20ª semana de gestação. 

Os achados apontam que gestantes que vivem em áreas mais vulneráveis têm até 68% mais chances de perder o bebê antes ou durante o parto, em comparação com as que vivem em regiões mais favorecidas.

Com participação do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), a pesquisa analisou nascimentos no Brasil entre 2000 e 2018, com base nos registros oficiais do Ministério da Saúde (MS) através do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) e Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM).

“Sabemos que há uma relação direta entre condições socioeconômicas, acesso inadequado aos serviços de saúde materna e baixa qualidade do cuidado durante a gestação e o parto”, explica pesquisadora do Cidacs/Fiocruz Bahia, Enny Paixão, que também é professora associada da London School of Hygiene and Tropical Medicine e uma das autoras do estudo. “Ainda não era claro exatamente quanto as condições socioeconômicas de cada município influenciavam essas taxas, agora, as evidências mostram claramente que essa diferença existe e tem impacto real nas taxas de natimortalidade”.

A pesquisadora também pontua que “investigar a natimortalidade entre municípios segundo o nível de privação é fundamental para identificar áreas que demandam melhorias no acesso e na qualidade da atenção perinatal”.

Mapa da desigualdade perinatal

Os pesquisadores utilizaram o Índice Brasileiro de Privação (IBP/Cidacs), que considera renda, escolaridade e condições de moradia, para classificar os municípios em níveis de privação material, também conhecida como níveis de posição socioeconômica. O padrão encontrado apontou que quanto maior a privação, maior o risco de o bebê não nascer com vida.

Em 2018, foram 28,6 mil natimortos no país, o equivalente a 9,6 por mil nascimentos. Embora o número esteja dentro da meta global de até 12 por mil, o dado esconde desigualdades. Nos municípios com melhores condições socioeconômicas, a taxa foi de 7,5 por mil. Já nos mais privados socioeconomicamente, chegou a 11,8 por mil.

Essa disparidade se torna ainda mais evidente quando se foca em regiões com níveis diferentes de realidade socioeconômica. A Região Nordeste, em 2012, apresentou a maior taxa de 12,1 natimortos por mil nascimentos, enquanto o Sul apresentou a menor prevalência, com 7,7 por mil nascimentos.

A pesquisa também revelou que as desigualdades pouco mudaram nos últimos 18 anos. Entre 2000 e 2018, a taxa nacional de natimortalidade caiu cerca de 1,1% ao ano. Além disso, cerca de 90% (25.847) das mortes fetais ocorreram antes do parto, o que, segundo os autores, pode indicar falhas no acompanhamento pré-natal e no monitoramento da saúde da gestante.

As mortes durante o parto, embora menos frequentes, representando 4,3% (1.229) dos natimortos, também se concentraram nas áreas de maiores privações, onde faltam infraestrutura hospitalar e profissionais qualificados.

“Já era esperado pelos pesquisadores que encontrássemos taxas mais altas de óbitos fetais nos municípios com maior privação. No entanto, vale destacar que, ao longo dos anos, foram observadas melhorias gerais, com redução das taxas de natimortalidade em quase todos os níveis de privação – exceto nos municípios mais vulneráveis, onde as taxas não apresentam evidências de queda”, enfatiza Paixão.

Desafio começa antes da primeira respiração

Apesar dos avanços na redução da mortalidade infantil e neonatal no Brasil, a natimortalidade segue como um problema muitas vezes silencioso. Por não envolver o registro de um nascimento com vida, o tema ainda recebe pouca atenção, mesmo representando uma perda humana e emocional devastadora para as famílias.

“Esses resultados destacam as fortes desigualdades nas chances de natimortalidade em todo o Brasil. São necessárias ações direcionadas para reduzir essas disparidades”, Paixão destaca.

Algumas das ações recomendadas são ampliar o acesso ao pré-natal, garantir infraestrutura adequada nas maternidades e reduzir desigualdades regionais na saúde perinatal. A pesquisadora completa que essas medidas devam ocorrer “especialmente nos municípios mais privados, a fim de diminuir as taxas de natimortalidade e melhorar a equidade em saúde perinatal”.

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