José Milton Longo*
A primavera é tradicionalmente associada à renovação, ao florescimento e à beleza. Em diversas culturas, ela simboliza o recomeço, o despertar da natureza após o rigor do inverno. No Brasil, a primavera é marcada por um aumento na vegetação, no canto dos pássaros e na sensação de esperança que acompanha os dias mais claros e floridos, sendo inimaginável uma primavera silenciosa.
A estação também é vista como um momento de transformação pessoal. As cores, os cheiros e fragrâncias aguçam os sentidos, despertando memórias e sensações únicas. A primavera nos faz sentir mais felizes e energizados, inspirando harmonia, equilíbrio e otimismo. É como um “novo nascimento” para a vida pessoal, um período para plantar sementes de novos propósitos.
Na natureza, o reflorescimento da flora transforma a paisagem com cores e vida nova. Do ponto de vista ecológico, a primavera traz temperaturas mais amenas, marcando a transição do inverno para o verão, dias mais longos e maior umidade, especialmente nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, favorecendo o crescimento da vegetaçãoe a proliferação de fungos e microrganismos essenciais para o equilíbrio dos ecossistemas. Árvores ganham novas folhas, flores desabrocham em profusãoe animais como abelhas e beija-flores intensificam sua atividade de polinização,desempenhando papel essencial na manutenção dos ecossistemas e na produção de alimentos. Muitos animais também saem da hibernação, aumentando a biodiversidadeda estação.
A estação marca o início da reprodução para muitas espécies, como anfíbios, aves e insetos polinizadores. Estudos mostram que algumas espécies de salamandras e pererecas têm migrado e se reproduzido mais cedo, em resposta às temperaturas anormalmente altas, podendo comprometer a sobrevivência dos ovos e filhotes.Pássaros migratórios também enfrentam desafios para sincronizar seus ciclos com a disponibilidade de alimento, e que podem afetar sua sobrevivência e reprodução.
Assim, as mudanças climáticas têm antecipado o início da estação em várias partes do mundo, afetando o ciclo natural das plantas e animais. Isso pode comprometer a reprodução de espécies e a produção agrícolase o clima não se mantiver estável, exigindo atenção científica e ações de conservação urgentes.
A primavera também impacta diretamente o comportamento humano. Estudos indicam que o aumento da luz solar e o contato com ambientes naturais melhoram o humor e reduzem o estresse. A estação trás inspiração para projetos sociais e ambientais, como hortas urbanas e campanhas de reflorestamento,expondoum reflexo da interação entre ciência e sociedade.
Destarte, a primavera continua sendo um poderoso símbolo de vida, da renovação e de esperança. No entanto, diante das mudanças climáticas e da perda de biodiversidade, ela também se torna um chamado à responsabilidade socioambiental, indo além das cores dos ipês do Cerrado, e do sabor do Tarumã.
A COP-30 vem aí, nesta primavera e no Brasil. Cabe à sociedade, guiada pela ciência, participar da elaboração e implantação de políticas públicas visando a proteçãodos ciclos naturais que sustentam a vida. Celebrar a primavera é também cuidar do planeta, garantindo que as futuras gerações possam vivenciar sua beleza e seus benefícios.
* Biólogo graduado pela Unicamp, possui mestrado e doutorado em Ecologia e Conservação pela UFMS. Ex-professor universitário, atualmente é consultor e sócio diretor da FIBRAcon Consultoria Ambiental. Atua em monitoramentos de fauna e flora em diversos empreendimentos, planos de manejo de Unidades de Conservação e processos de licenciamento ambiental. É o responsável pela Delegacia Regional do CRBio 01 em Campo Grande/MS
