Produtores americanos pedem que Trump priorize a soja nas negociações com a China, diante da perda de mercado para o Brasil.
Anderson Viegas

A cruzada tarifária do presidente norte-americano Donald Trump contra o mundo vem provocando desconforto dentro do próprio país. A Associação Americana de Soja (ASA) divulgou nesta terça-feira (19) um comunicado pedindo que ele priorize a oleaginosa nas negociações com a China e alertando que as tarifas de retaliação estão excluindo os agricultores norte-americanos de seu maior mercado de exportação, abrindo espaço para o produto brasileiro, incluindo o de Mato Grosso do Sul. Leia o comunicado da ASA aqui!
Dados do ComexStat, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) do Brasil, mostram que o temor dos produtores dos EUA já é uma realidade. Em julho de 2025, as exportações brasileiras de soja em grãos para a China totalizaram 9,580 milhões de toneladas, com receita de US$ 3,932 bilhões. No mesmo mês de 2024, haviam sido embarcadas 8,921 milhões de toneladas, resultando em US$ 3,922 bilhões. O crescimento absoluto foi de 659 mil toneladas, equivalente a 7,38% a mais em volume. Já a receita teve aumento modesto, de apenas US$ 9,9 milhões (0,25%).
Em Mato Grosso do Sul, em julho de 2025, foram exportadas 731,9 mil toneladas de soja para a China, gerando US$ 295,958 milhões. No mesmo mês de 2024, os embarques haviam alcançado 691,9 mil toneladas, com receita de US$ 303,835 milhões. Isso representa um crescimento de 40 mil toneladas (5,77%), mas com queda de US$ 7,9 milhões na receita (–2,59%).
O crescimento do volume exportado, tanto pelo Brasil quanto por Mato Grosso do Sul, não se traduziu em incremento proporcional de receita devido à queda nos preços internacionais da soja entre os dois anos. Em julho de 2024, as cotações futuras na Bolsa de Chicago ficaram entre US$ 11,45 e US$ 11,80 por bushel, enquanto em julho de 2025 os valores recuaram para cerca de US$ 10,13 por bushel.
Segundo a ASA, historicamente a China importa mais de 60% do suprimento mundial de soja e tinha os Estados Unidos como principal fornecedor. Com as tarifas retaliatórias, porém, a soja americana ficou 20% mais cara que a sul-americana, levando os chineses a aumentarem a demanda pelo produto brasileiro, cuja produção foi ampliada para atender ao mercado.
O analista de economia da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso do Sul (Aprosoja/MS), Mateus Fernandes, destaca que, no caso da soja, qualquer medida de taxação dos EUA sobre exportações ou negociações internacionais pode deslocar a demanda global. “Se a China, principal compradora do grão, reduzir suas compras nos EUA em função de barreiras ou disputas comerciais, tende a buscar outros fornecedores, como o Brasil, aumentando as exportações sul-mato-grossenses e fortalecendo o superávit”.
Entenda a guerra
Após assumir a presidência dos Estados Unidos, Trump promoveu sucessivos aumentos tarifários sobre produtos chineses, que chegaram a 145% em alguns casos. A China respondeu com tarifas de até 125%. Essas medidas aprofundaram a crise comercial entre os dois países, afetando, entre outros segmentos, a soja, cujas exportações norte-americanas para a China já vinham em queda nos últimos anos em razão das barreiras impostas por Pequim.
Em meio à crise, Trump assinou nesta segunda-feira (18) uma ordem executiva adiando a entrada em vigor das tarifas sobre produtos chineses, prorrogando um acordo costurado no fim de julho, após negociações entre os dois países. Nessa trégua, os dois lados concordaram em suspender a maior parte das tarifas: os EUA reduziram as alíquotas para 30%, enquanto a China baixou para 10%. Ao mesmo tempo, Trump pressionou Pequim a ampliar as compras de soja americana, em uma tentativa, até agora frustrada, de compensar parte do impacto tarifário e reduzir o déficit comercial.